Pequeno
Relatório
FÓRUM
Vigo, 22 de Maio 2004
A SUSTENTABILIDADE ECOLÓGICA: ALTERNATIVAS FEMINISTAS
A sala do Centro Cultural Caixanova estava enfeitada
com dous murais feitos em material vegetal: um com o logotipo da
Marcha Mundial, e outro com uma mulher debuxada em violeta envolta
numa espiral que partia do seu embigo, com folhas coladas de plantas
que as mulheres trouxeram. Como comentou Carme
Adán na apresentaçom, simbolizava a uniom das
mulheres com a natureza, da qual indissoluvelmente fazemos parte.
E como também comentou Carme e recolheu depois Mª
José Guerra, nom queremos ser princesas,
no dia da famosa boda de estado, que todo o enchia enquanto as mulheres
seguimos passo a passo construindo o mundo que queremos.
Neste Foro uma professora, duas sindicalistas do campo e uma mulher
da MMM partilharom as suas reflexons, assim como algumas interessantes
intervençons das assistentes, mulheres de diferentes países,
onde público e ponentes transmitirom a necessidade e o sentimento
de urgência de estabelecer redes de colaboraçom entre
as mulheres rurais e urbanas, as produtoras e as consumidoras, as
de países ricos e empobrecidos.
Mª José Guerra sentou
uma base teórica da sustentabilidade humana e ecológica,
e como o feminismo e o ecologismo acabarom unindo-se através
da prática dando lugar a uma nova teoria, a do ecofeminismo.
Rosa Isela Serrano falou com a
clareza da honestidade e de quem sabe muito bem o que dize, desde
a auto-organizaçom, e defendeu em especial a soberania alimentar
dos povos. Falou de situaçons das mulheres mexicanas que
nos som conhecidas às galegas, como a emigraçom.
Lídia Senra falou desde
a Galiza, enlaçando as necessidades das mulheres do campo
com as das consumidoras/es, o abandono do meio rural e o futuro
do nosso país, com a soberania e seguridade alimentares.
Brigitte Verdière informou
da realizaçom da Carta das Mulheres à Humanidade,
dos seus princípios e metodologia, e leu alguns dos textos
relativos ao ambiente, a sostenibilidade e os recursos naturais.
Mª
José Guerra Palmero: professora de Filosofia Moral da Universidade
da Laguna (Canarias).
Partiu da ideia de que a sustentabilidade ecológica é,
enfim, a própria sustentabilidade humana.
A confluência do ecologismo e o feminismo deu-se através
do activismo ( nom se partia de uma teoria prévia comum).
As mulheres fomos historicamente relacionadas com a natureza, pola
tarefa reprodutiva, o corpo, a sexuaçom... e isto foi utilizado
para defender a nossa inferioridade.
Actualmente, no feminismo global temos o repto de formar um núcleo
comum frente à globalizaçom. Temos que construir alternativas
a nível mundial, para eliminar conjuntamente a subordinaçom
das mulheres e a destruiçom do meio natural. A feminizaçom
da pobreza vai ligada à insostenibilidade do planeta do capitalismo
globalizado. Crítica feminista à economia do capital,
citando a Cristina Carrasco: o trabalho do cuidado é asignado
às mulheres de jeito transcultural; a economia ortodoxa nom
considera a sustentabilidade humana, todo esse trabalho nom remunerado
caracterizado pola invisibilidade, senom que se centra na produçom,
o trabalho, o salário, a monetarizaçom, os bens tangíveis...
A crítica feminista coincide com a ecologista. O cuidado
da vida humana deve ser uma responsabilidade social e política.
O mito do homem provedor está já caído, actualmente
som muitas mulheres as que mantèm uma família em solitário.
Na nossa luta temos que incluir todos os pontos de vista, especialmente
o das mulheres dos países empobrecidos, a fame, a violência,
o SIDA...
Rosa
Isela Serrano - da Comissom de Coordenaçom da AMMOR, México.
Começou assinalando a necessidade de mais
articulaçom das mulheres a nível internacional para
salvar o campo.
O conceito de desenvolvimento sustentável é
como um poliedro com muitas caras. Pode ser visto de duas perspectivas:
- a predominante nas empresas transnacionais: só ambientalista,
a curto prazo, fala da exploraçom racional dos
recursos; e que para o progresso tem que haver concentraçom
de recursos económicos como um mal necessário. Nom
considera a cultura dos povos afectados por esta exploraçom,
a sua economia, sociedade... os recursos biogenéticos. Por
exemplo, o plano Puebla Panamá atinge toda a
zona maia, (parte de México e Panamá) onde se originou
essa planta tam familiar na Galiza como o milho.
Sinalou o fracasso da reuniom de Cancún, ao que nom assistirom
muitos governos dos países pobres como uma forma de mostrar
o seu malestar.
A propriedade dos recursos, da terra, é maioritariamente
dos homens; as camponesas possuem um 17 % desta em México,
e a nível mundial o 1%. Por isso nom se vê o trabalho
das mulheres, mas é essencial. Ademais em México está-se
a dar a situaçom de muitas mulheres que ficam ao frente das
suas terras e famílias porque os homens emigram.
- O desenvolvimento sustentável como conceito em construçom
; p. ex., desde Via Campesina mantem-se uma dupla luta,
o que chamam protesta con propuesta, contra a liberalizaçom,
e a globalizaçom do mercado; o saqueo de sementes, plantas
medicinais, agua e cultura.
Na acçom local estám a trabalhar com perspectiva de
género. Tentam integrar os elementos femininos: a sensibilidade
para identificar os efeitos na natureza e nas crianças das
políticas, como nais e mulheres, pois sabemos que nom somos
mais do que a natureza, mas parte dela. Tem que haver espaços
de intercâmbio, equidade (igualdade) entre géneros
e na economia; esperar os momentos propícios para a produçom...
Há grupos de mulheres para alternativas económicas
nas mulheres do rural, projectos que aumentam a auto-consciência.
Aprendem a exigir ajudas económicas conscientes de que lhes
correspondem, em lugar de mendigá-las. Há mulheres
cabeças de família que nom tenhem terra em propriedade.
A seguridade e a soberania alimentar deve residir nas camponesas/es
e consumidoras/es, deve-se fortalecer o mercado interno.
Acabou avogando por um mundo onde as mulheres nos podamos integrar
de uma forma diferente, um mundo onde as mulheres sim existamos,
levantando os aplausos das assistentes.
Lídia
Senra - Secretária do Sindicato Labrego Galego
Começou sinalando que só conhece dous
movimentos frente a globalizaçom: um é a Marcha Mundial
das Mulheres, e outro Via Campesina. Assim de clara foi toda a sua
intervençom. Colocou a questom da necessidade de redes de
mulheres para a colaboraçom, o debate sobre o desenvolvimento
sustentável... e felicitou à MMM por abordar este
tema, que é muito amplo.
Nom há desenvolvimento sustentável sem a incorporaçom
das mulheres; p. ex. na Galiza as labregas tenhem dificuldades para
ser isso, labregas, ser titulares de terras, para pagar a segurança
social, etc. Som mulher, som galega, som labrega, som três
discriminaçons.
Nesta ocasiom centrou-se na alimentaçom por dous motivos:
- porque é um direito humano básico
- porque as mulheres temos um importante papel nela: como produtoras,
e como as responsáveis de decidir cada dia o que se pôm
na mesa; mesmo que nom gostemos, hoje por hoje é assim. E
fazemo-lo apenas ao nível doméstico: nom temos poder
de decisom nas políticas agrícolas e alimentares.
Queremos que a alimentaçom seja suficiente, sana, segura
e nutritiva. Estamos fartas de escuitar a sindicalistas profissionais
e governantes dizer que o mercado manda, e a dona de
casa prefire o produto bonito ao natural da sua terra, de que nos
tratem por parvas e por cima responsabilizem às mulheres
do que se come".
O trabalho das mulheres é pouco ou nada valorizado: na produçom,
na compra...por ex. na lactáncia infantil, se nos dize que
o nosso leite nom vale e há que comprar leite
adaptado, assim as multinacionais nos manejam; metem-nos a ideia
de que só vale o que se paga, e o nosso leite
nom se paga.
Práticas na agricultura: dominam os interesses da indústria
agro-química farmacéutica: controlam os governos,
os preços... A industrializaçom da agricultura está
a chegar à manipulaçom genética, que nom é,
em absoluto, como argumentam para tirar a fame. Detrás
de normas sanitario-higiénicas, está a intençom
de expulsar as camponesas do seu posto de trabalho, como a venda
directa dos seus produtos na praça que para muitas era o
único dinheiro próprio de que dispunham. Isto na Galiza
praticamente se eliminou, e de um jeito mais fácil porque
era uma actividade de mulheres. Por causa da industrializaçom
estám-se a dar cancros, malformaçons fetais polo emprego
de pesticidas...
Na Galiza, a desapariçom de postos de trabalho no campo tem
um exemplo muito claro no sector lácteo, e em geral levou
à situaçom actual de agonia e morte do meio rural.
Frente a isto, a soberania alimentar é básica e um
direito fundamental dos povos. Desde o SLG, a Coordenadora Labrega
Europeia e a Via Campesina, trabalham alternativas ao desenvolvimento
rural, mas nom tenhem poder de decisom, e precisam-se alianças.
As mulheres temos que aprofundar no debate, dotar-nos de auto-estima
- a alimentaçom é importante -, incorporar os homens
ao 50% na responsabilidade desta. O conceito de seguridade
alimentar está na moda, mas sem ter em conta as organizaçons
de camponesas/es; o que é seguridade alimentar? Há
muitos controlos veterinários da carne, mas o que controlam?
Muitas cousas, mas nom os resíduos que ficam no nosso corpo
depois de comê-la, e quanto aos transgénicos som legais,
nom passam nenhum controlo.
Deve haver redes de comercializaçom, deve-se manter a venda
directa.
Outro tema relacionado com as mulheres é o das sementes,
que estiverom nas suas maos, conservando as tradicionais e transmitindo-as,
e hoje já nom há semente autóctone, som compradas.
Brigitte
Verdière - do Secretariado Internacional da Marcha Mundial
das Mulheres, Quebeque.
De cara às acçons internacionais da
Marcha de 2005, está-se a trabalhar na Carta das Mulheres
à Humanidade. Está feito um rascunho e enviado aos
grupos da MMM. Tenciona-se que seja um texto colectivo, por isso
as contribuiçons serám recolhidas até Julho-Agosto,
com elas será elaborado um novo texto, e reenviado aos grupos
de todo o mundo. A aprovaçom final será no V Encontro
Internacional da MMM, em Dezembro no Ruanda.
Por quê uma Carta da mulheres à humanidade? Em primeiro
lugar, a Carta actual nom nos convém; precisamos que emane
das próprias mulheres, por isso é importante que participem
todas, p. ex.a Via Campesina está a colaborar. A novidade
desta Carta é que está dirigida a todas e a todos,
aos movimentos sociais que lutam contra o actual sistema patriarcal
e capitalista.
É centrada em cinco valores fulcrais: igualdade, liberdade,
solidariedade, justiça e paz. É feita por e para a
Humanidade, com um sentimento de urgência perante a concentraçom
de riquezas nas mãos de alguns; os recursos naturais som
património da humanidade e para as geraçons presentes
e futuras, há que frear a dilapidaçom. Os bens
e os saberes som para todas e todos, frente à ideologia
da competitividade.
As sociedades sustentáveis: o DS como progresso
é imposto; o humano deve ser a prioridade. Na sociedade que
queremos construir queremos democracia participativa, as responsabilidades
som dos governos e dos povos. Viver num território com uns
recursos engendra direitos e responsabilidades. Queremos seguridade
na alimentaçom, vivenda, vida sem violência, e convívio.
Impom-se uma forma alternativa de economia, e o valor da ética.
DEBATE
- Uma companheira italiana assinalou que a
maioria das europeias nom vivem no rural, mas na cidade. Leu um
texto apresentado na FS Europeu de París: Cuidemos
o mundo: desde a casa à cidade e o planeta: Em
todo o planeta as mulheres encarregam-se de gerar a vida e, mediante
o seu trabalho consistente em cuidar, regeneram-na, mas depois som
os homens quem dominam a economia, a política e a informaçom,
que decidem como hai que viver. (...) A própria Europa vê-se
golpeada continuamente por estes desastres e poucas pessoas parecem
dar-se conta de que o predomínio masculino ocidental parece
mais um aprendiz de bruxo que já nom pode controlar os destroços
provocados (...) Nom podemos lavar as maos, entre outras cousas
porque se queremos ter um mundo melhor, algo possível e cada
vez mais necessário, é fundamental construir com a
perspectiva de um mundo multipolar uma Europa social, económica
e política que também seja diferente, possível
e necessária. (...) Existe uma continuidade entre as antiquissimas
sociedades que se reconheciam na Grande Deusa, a Deusa Nai, e as
afirmaçons do ecofeminismo do s.XX, em particular no pensamento
de Vandana Shiva, fundamento perenemmente reformulado e contaminado
por novos contributos, mesmo de mulheres europeias, que levantaram
o véu a uma concepçom da natureza introduzida pola
revoluçom científica do s. XVIII em Inglaterra e estendida
rapidamente por toda Europa, e pouco a pouco, na onda do capitalismo,
o colonialismo e a globalizaçom, por todo o planeta.
- Uma companheira da UMAR falou da situaçom das mulheres
num sector tam importante para Portugal como a pesca, onde persiste
a sua invisibilidade pois nom têm estatuto reconhecido; estám
a trabalhar com as pescadoras com a ajuda do projecto Equal europeu,
também com outros países europeus com situaçons
semelhantes, pois para a Uniom a pesca nom é importante,
mas para alguns países sim; para Portugal é a segunda
área mais importante.
- Uma companheira galega que trabalha com mulheres do rural entre
Galiza e Andalucia assinalou a importância da relaçom
com as associaçons de mulheres e o movimento feminista, e
de estabelecer redes nom apenas aqui mas também com Latinoamérica.
- Uma companheira da MMM de Euskal Herria saudou-nos em euskara
e falou de que na actualidade primam os critérios económicos
a curto prazo, o qual nos trai transgénicos, hormonas, privatizaçom
da energia, das infraestuturas, mudanças no consumo... As
mulheres vivemo-lo no consumo e como produtoras, as nossas casas
estám cada vez mais cheias de ondas, resíduos... Em
Euskal Herria apenas o 3% das mulheres possuem mais de uma hectárea
de terra, o resto fica à margem das ajudas. Advogou polo
apoio às culturas das mulheres rurais e urbanas, primar as
economias locais, as sementes autóctones. Falta conhecimento
e redes de apoio entre mulheres.
- Uma companheira galega colocou a pergunta de como passamos à
acçom, como unimos as mulheres urbanas e rurais. Lídia
Senra assinalou a dificuldade de que as produtoras metam os seus
produtos no mercado, e a das consumidoras de encontrá-los,
a OMC impom-se, mas cada vez mais mulheres som conscientes disto.
- Uma mulher da COAG, agricultora ecológica, criticou a política
Agrária Comunitária e a perda de valores.
- Uma mulher pertencente a uma associaçom de consumidoras/es
de agricultura ecológica de Lugo animou a todas à
auto-organizaçom: perante a dificuldade de achar estes produtos
no mercado, as pessoas estám a associar-se e a comprar em
comum estes produtos, dando prioridade aos produtos locais; também
há associaçons deste tipo em outras cidades como Vigo.
- Outra mulher assinalou a importáncia de educar na alimentaçom
desde a infância, p ex. o leite adaptado já condiciona
as crianças desde o nascimento, as verduras...
- Uma outra companheira de EH falou do importante papel das mulheres
como consumidoras, já nom na alimentaçom, mas na roupa,
cosméticos, pensos e tampons... somos um alvo do consumo,
e o nosso corpo nom deve sê-lo; chamou à sabotagem
aos hipermercados.
- Rosa Serrano fechou dizendo que o controlo é duplo: dos
alimentos e dos recursos biogenéticos dos países.
Propujo trabalhar desde o local pensar global, agir local.
Defendeu seguir sendo países, que é uma
tarefa de todas as mulheres, nom apenas das camponesas. Boicotar
os produtos norte-americanos pode ser uma opçom, mas há
que ter em conta que nos EEUU também há pequenas agricultoras/es
que estám a desaparecer, e que é importante unir-se.
Ourense, 26 de Maio de 2004
Mónica Gonçalves
Activista de MNG e da Coodenadora da MMM de Ourense
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